A preocupação humana com o amanhã parece sempre ter existido. Foi assim com os antigos Maias – que, depois de Nostradamus, se tornaram a mais recente expectativa sobre o fim do mundo com o filme “2012” – e também o foi nos dias de Jesus. Lembro-me da ocasião em que os próprios discípulos perguntaram ao Mestre como seria o fim de todas as coisas – como em Marcos 13. A questão surge das duras palavras de Jesus sobre o Templo de Jerusalém, símbolo do orgulho judeu. Assustados ao saber que ele seria destruído com a queda da cidade, os discípulos se viram tomados pela dúvida angustiante sobre quando isto ocorreria.
A pergunta é inevitável: será também que o futuro que nós esperamos vai mesmo acontecer? Numa realidade não muito distante, testemunhamos o surgimento de pregadores que, aclamados por multidões, apregoam a vinda do avivamento em todas as direções, criando uma expectativa de conversão mundial. Pela “palavra profética”, declaram que estamos vivendo um tempo de milagres e renovação – apesar de os efeitos não serem muito visíveis na sociedade. Estariam eles corretos? A “bela reforma” que afirmam estar acontecendo neste “templo” dará algum resultado? As profecias bíblicas são capazes – como no caso dos discípulos – de fazer ruir nosso presunçoso “achismo” sobre o futuro, ainda que ele demonstre imponência como a beleza daquele Templo e pareça estar totalmente estabelecido como pareciam seus fundamentos.
Em Mc 13.5-7, dois grandes fatos são afirmados pelo Senhor como sendo a tônica do fim. O primeiro deles é o aparecimento do erro: “e enganarão a muitos”. Cristo afirma que, no fim, o engano se espalharia tomando moldes de religiosidade e seu alcance seria generalizado. Se seus discípulos estivessem esperando sucesso e prosperidade, ficariam desapontados. Mais do que isso, ao invés de esperar a vitória imediata da verdade, Jesus os alerta a esperar uma sociedade cada vez mais mergulhada na loucura, injustiça e imoralidade.
Estamos – nas palavras de Jesus – vivendo o tempo da falência da igreja como veículo de disseminação da verdade. No entanto, não me refiro aqui à Igreja Invisível, que é a “coluna e sustentáculo da verdade” (1Tm 3.15). Esta jamais sucumbirá. Falo da igreja-instituição, que se encontra em colapso gradativo em pleno século XXI, perdendo há muito as credenciais que caracterizavam sua influência na sociedade. Confiabilidade, alento, orientação, exemplo – aonde? Seja em que face se apresente, a essência da religião tem sido deflorada e se encontra ruindo. Não poucos homens fidedignos atestam que já estamos sob um quadro global de crise: o cristianismo nominal é dominante na Europa e América do Norte, enquanto a África e a América Latina mergulharam em um “cristianismo místico”. No Brasil, os arraiais religiosos, mais do que nunca, estão tomados pela corrupção, manipulação psicológica e estelionato. O próprio evangelicalismo jaz em descrédito, e uma fé que antes era odiada pelo puritanismo de seu posicionamento, agora é ridicularizada por sua fraudulência descarada.
Hoje, e agravando-se para o futuro, assistimos ao renascimento do cientificismo, que dominará ainda mais todo o meio acadêmico, expulsando de vez o sobrenatural de qualquer categoria de pensamento válido. O homem se torna deus e, na quebra sucessiva de paradigmas científico-tecnológicos, arroga o direito de manipular a vida. Logo os limites impostos pela moral serão reputados como costumes primitivos e a ciência poderá dar à luz sua monstruosidade insana. A religiosidade, porém, será tolerada como um fenômeno social necessário – mal necessário, entenda-se. Deste lado, o crescente avanço do misticismo, inserindo-se nas diversas manifestações de religiosidade, produzirá um sincretismo tão plural que, no final, toda religião será reduzida a uma mesma coisa. O fanatismo será a conduta de fé normal e a superstição a única forma de conceber a espiritualidade. Experiências de êxtase serão – se já não o são – o encontro real com “Deus”, uma fuga emocional de um mundo que não tem nem terá mais razão, num abandono total da verdade.
Em segundo lugar, Cristo afirma o aparecimento de um caótico cenário de guerra: “ouvireis falar de guerras e rumores de guerra”. Ele se refere, de fato, à guerra propriamente dita, mas também a um estado de belicismo estabelecido. Se seus discípulos estivessem esperando paz e harmonia, ficariam chocados. Pelo contrário, os homens se tornarão tão sádicos que a sociedade se verá incapaz de refreá-los. Jesus os alerta a esperar um mundo cada vez mais embrutecido pelo ódio, violência e hostilidade.
Como consequência direta do repúdio à verdade, o ser humano perde sua própria humanidade. A busca desenfreada pela autossatisfação se mostrará insaciável. Em um ambiente onde é preciso provar constantemente que se é a melhor opção, a melhor ferramenta, enfim, que se é o candidato mais apto à sobrevivência, é exigida uma desumanização do ser. O mundo, então, se tornará uma gaiola onde bestas insensíveis se trombam toda hora, sem tempo, sem pudor e sem remorso. Uma “coisificação” experimentada friamente, onde a miséria do outro será o triunfo pessoal. A desgraça alheia será planejada, definida e executada, mas de maneira tão sagaz que além de aparentar ser mera tragédia, será também, na prática, uma jogada onde até oferecer ajuda se torne extremamente lucrativo – aliás, já o é. Só restará sentido no bel-prazer, não importando mais os meios para tanto. Assim surgirá a “sociedade insociável” – se é que o termo é possível.
Muros de concreto já não serão divisórias, porque as próprias ruas serão corredores invisíveis de isolamento, por onde passam cadáveres ambulantes, trancafiados na malícia e desconfiança. O desespero alcançará até a mais alta autoridade. A luta pela vida jorrará sangue pelas calçadas. Saques, vandalismo e assassinato serão o expediente diário de multidões, privadas de dignidade. A escassez de recursos eliminará de vez a ilusória igualdade de direitos. O “vício da vontade” será a única lei e a justificativa para matar. E em nome de si mesmo, na batalha pelo que se quer, as pessoas se tornarão ainda mais a dementes. A frequência e proximidade com que se verá o estupro, a agressão e o homicídio já não causarão asco, mas verdadeira obsessão – um prazer demoníaco pela carnificina. A violência será a desumanização materializada, numa ausência total do amor.
É chegado o tempo – e ainda o será mais intensamente – em que aqueles que perseveram na luta contra o erro e a violência serão reputados por loucos. Tempo em que a verdadeira voz profética será tida como inconvenientemente perturbadora (Is 30.10). “Ninguém vos engane” (Mc 13.5), porém, é o alerta que esmaga toda tentativa de suavizar o evangelho. Por isso, faço minhas as lúcidas palavras de J. C. Ryle: “Deixemos de esperar por um reino de paz em nossos dias. Pelo contrário, esperemos por guerras. Deixemos de imaginar que todos os homens se tornarão santos, por meio de qualquer instrumentalidade existente – escolas, missões, pregações ou de qualquer coisa desse tipo. Pelo contrário, devemos aguardar o surgimento do Anticristo [...] Não haverá paz universal enquanto o Príncipe da paz não voltar”. Este é o fim que devemos esperar. Cabe a nós orar, trabalhar e aguardar com paciência até que o Senhor venha. Manter esta convicção pode custar muito caro, mas, o fim provará quem está correto. Para além da imaginação, sem Nostradamus, Maias ou em 2012. A previsão já foi lançada por Quem conhece o fim desde o começo. O amanhã não trará surpresa, vertendo cada letra divina em realidade. Sobre isto, lancemos os olhos e reflitamos. Entretanto, quem ainda se deixa levar pela aparência e sonha acordado, na verdade, ainda está dormindo.
Deus nos abençoe no amor de Cristo.
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