Início de ano incomum. Cientistas ingleses descobrem a maior estrutura jamais vista no universo, enquanto um meteoro explode no céu da Rússia e fere centenas de pessoas. Governos em todo mundo definem sua sucessão política e o Brasil conhece uma das maiores tragédias de sua história, num incêndio em Santa Maria. Em pleno carnaval brasileiro, a notícia da renúncia do Papa Bento XVI surpreende o mundo, causando espanto e questionamentos.
O impacto da decisão de Bento XVI é facilmente compreensível, notável no silêncio mórbido de alguns segmentos da sociedade e na vociferação de outros. O Vaticano é a sede de uma das instituições mais antigas e influentes do planeta, possuindo ramificações em todas as partes do mundo. Contando com mais de 1 bilhão de fiéis, o catolicismo romano é uma das religiões mais centralizadas em estrutura, constituindo também um Estado politicamente reconhecido e independente, organizado como cidade do Vaticano, no centro de Roma, e referido pela diplomacia internacional como a Santa Sé.
É aí que se justifica o clima de suspense. Trata-se, portanto, de uma lacuna aberta a múltiplas implicações. Bento XVI tem enfrentado uma série de desafios no curto período de seu pontificado. Escândalos de pedofilia, especialmente nos Estados Unidos – que receberam tratamento superficial e custaram milhões em indenizações à Sé romana – dificuldade em tratar de temas seculares e incapacidade de diálogo com outras religiões – sobretudo o islamismo – podem ser apontados como as causas imediatas da renúncia. Contudo, em meio aos problemas de saúde e a admiração ufanista de seu altruísmo e coragem, Bento XVI revela ao mundo razões súbitas e forças ocultas que o levam a deixar a cátedra papal vazia.
O Vaticano é um Estado, e o Papa, antes de ser líder de uma religião, é um chefe de Estado. E como todo Estado, não pode escapar a todos os interesses, conflitos e contradições envolvidos no controle do poder. Bento XVI denuncia em sua retirada, ainda que sutilmente, a falência interna de um sistema. Disputas, hipocrisia e falta de transparência são as palavras que ele usa para definir o nível da corrupção e politicagem. Temas nunca resolvidos pela igreja que agora afloram, mas que se tornaram parte de seus alicerces.
Mas antes que se pense em atacar e defender partidos, creio que a circunstância histórica que presenciamos revela não uma crise particular do catolicismo romano. Na grande conexão sob a qual vivemos, nos vemos todos mergulhados numa crise do ser. Um colapso global que atinge a integridade e validade das instituições, sejam religiosas, políticas ou sociais. Vivemos numa crise ética. Democracia não é sinônimo de liberdade, cidadania não garante direitos, religião não é a prática do amor. A cátedra vazia é o símbolo da lacuna aberta na consciência coletiva, que se desdobra num verdadeiro abismo na consciência de cada indivíduo.
A grande lástima é que nenhum pontífice está à altura dessa responsabilidade. Nenhum conclave pode determinar os rumos da história. Nenhuma reforma é suficiente pra alterar um quadro que exige uma revolução em cada ser humano. No fim das contas, Bento XVI – ou o simples Joseph Alois Ratzinger – nos lembra que não se pode enfrentar a máfia – seja lá com que cara e onde ela se apresente – sem se tonar um mafioso. Ou há de se fugir dela, ou se acaba unido a ela, mesmo aos poucos, numa entrega homeopática de consciência. Mas Jesus mesmo não foi militante, nunca propôs um projeto de tomada de poder. Nele, não há sentido em engajar-se num cemitério.
Enquanto muitos esperarão a escolha do novo Papa e suas novas propostas, seguirei a proposta simples do evangelho: “Sai dela, povo meu, para que não sejas participante dos seus pecados, para que não incorras nas suas pragas” – Ap 18.4. Continuarei também saindo, toda vez que se tornar insuportável a convivência com a mentira, abandonando as relações que não se deixam mais influenciar pela simplicidade do amor e me desligando das convenções instituídas pela maldade, das tramoias combinadas na surdina, da vantagem imediata de se corromper. Início de ano incomum. E infelizmente, lacuna na consciência cada vez mais comum a todos.
E você, o que vai fazer? Fica ou escolhe sair?
O impacto da decisão de Bento XVI é facilmente compreensível, notável no silêncio mórbido de alguns segmentos da sociedade e na vociferação de outros. O Vaticano é a sede de uma das instituições mais antigas e influentes do planeta, possuindo ramificações em todas as partes do mundo. Contando com mais de 1 bilhão de fiéis, o catolicismo romano é uma das religiões mais centralizadas em estrutura, constituindo também um Estado politicamente reconhecido e independente, organizado como cidade do Vaticano, no centro de Roma, e referido pela diplomacia internacional como a Santa Sé.
É aí que se justifica o clima de suspense. Trata-se, portanto, de uma lacuna aberta a múltiplas implicações. Bento XVI tem enfrentado uma série de desafios no curto período de seu pontificado. Escândalos de pedofilia, especialmente nos Estados Unidos – que receberam tratamento superficial e custaram milhões em indenizações à Sé romana – dificuldade em tratar de temas seculares e incapacidade de diálogo com outras religiões – sobretudo o islamismo – podem ser apontados como as causas imediatas da renúncia. Contudo, em meio aos problemas de saúde e a admiração ufanista de seu altruísmo e coragem, Bento XVI revela ao mundo razões súbitas e forças ocultas que o levam a deixar a cátedra papal vazia.
O Vaticano é um Estado, e o Papa, antes de ser líder de uma religião, é um chefe de Estado. E como todo Estado, não pode escapar a todos os interesses, conflitos e contradições envolvidos no controle do poder. Bento XVI denuncia em sua retirada, ainda que sutilmente, a falência interna de um sistema. Disputas, hipocrisia e falta de transparência são as palavras que ele usa para definir o nível da corrupção e politicagem. Temas nunca resolvidos pela igreja que agora afloram, mas que se tornaram parte de seus alicerces.
Mas antes que se pense em atacar e defender partidos, creio que a circunstância histórica que presenciamos revela não uma crise particular do catolicismo romano. Na grande conexão sob a qual vivemos, nos vemos todos mergulhados numa crise do ser. Um colapso global que atinge a integridade e validade das instituições, sejam religiosas, políticas ou sociais. Vivemos numa crise ética. Democracia não é sinônimo de liberdade, cidadania não garante direitos, religião não é a prática do amor. A cátedra vazia é o símbolo da lacuna aberta na consciência coletiva, que se desdobra num verdadeiro abismo na consciência de cada indivíduo.
A grande lástima é que nenhum pontífice está à altura dessa responsabilidade. Nenhum conclave pode determinar os rumos da história. Nenhuma reforma é suficiente pra alterar um quadro que exige uma revolução em cada ser humano. No fim das contas, Bento XVI – ou o simples Joseph Alois Ratzinger – nos lembra que não se pode enfrentar a máfia – seja lá com que cara e onde ela se apresente – sem se tonar um mafioso. Ou há de se fugir dela, ou se acaba unido a ela, mesmo aos poucos, numa entrega homeopática de consciência. Mas Jesus mesmo não foi militante, nunca propôs um projeto de tomada de poder. Nele, não há sentido em engajar-se num cemitério.
Enquanto muitos esperarão a escolha do novo Papa e suas novas propostas, seguirei a proposta simples do evangelho: “Sai dela, povo meu, para que não sejas participante dos seus pecados, para que não incorras nas suas pragas” – Ap 18.4. Continuarei também saindo, toda vez que se tornar insuportável a convivência com a mentira, abandonando as relações que não se deixam mais influenciar pela simplicidade do amor e me desligando das convenções instituídas pela maldade, das tramoias combinadas na surdina, da vantagem imediata de se corromper. Início de ano incomum. E infelizmente, lacuna na consciência cada vez mais comum a todos.
E você, o que vai fazer? Fica ou escolhe sair?
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