"As instituições estão fraturadas, todos os poderes estão fora do eixo". A conclusão é do jurista Miguel Reale Júnior, em entrevista dada ao Estadão Notícias nesta quarta, dia 17 de abril. Explico.
Depois da instauração de um inquérito para a apuração de "fake news" cujo alvo das ofensas seriam os ministros do STF (conforme descrevo aqui), na tarde desta última segunda, dia 15, o Ministro Alexandre de Moraes ordenou a retirada da matéria que liga o atual Presidente do Supremo, Dias Toffoli, à Odebrecht, veiculada pela revista Crusoé e o site O Antagonista. A censura provocou a indignação de renomados juristas nacionais, fato que trouxe à memória os mais obscuros tempos da inquisição medieval.
Não obstante, na manhã desta terça, dia 16, Alexandre de Moraes autorizou ainda oito mandados de busca e apreensão e determinou bloqueios de contas em redes sociais. Seguiu-se, à tarde, o início de um confronto direto entre instituições. Em manifestação dirigida ao Ministro Alexandre de Moraes, a Procuradora-geral da República, Raquel Dogde, informou o arquivamento do Inquérito 4.817 [1], o mesmo instaurado de ofício por Dias Toffoli. Conforme observou Dodge, em posicionamento juridicamente questionável, mas politicamente memorável, "O sistema penal acusatório estabelece a intransponível separação de funções na persecução penal: um órgão acusa, outro defende e outro julga. Não admite que o órgão que julgue seja o mesmo que investigue e acuse".
Destarte, horas após, o Ministro Alexandre de Moraes indeferiu a Promoção Ministerial, argumentando, dentre outros, que "Na presente hipótese, não se configura constitucional e legalmente lícito o pedido genérico de arquivamento da Procuradoria Geral da República, sob o argumento da titularidade da ação penal pública impedir qualquer investigação que não seja requisitadaa (sic) pelo Ministério Público" [2].
Estava demonstrada a queda de braço entre o MPU e o STF.
Por sua vez, em entrevista à TV Globo, o Ministro Marco Aurélio não poupou reprovações à controvérsia, salientando que houve um retrocesso evidente: "Estou há 28 anos no Tribunal e nunca vi uma decisão dessas de retirar reportagem. Pela nossa Constituição, todos temos direito à informação, presta informação, direito à livre expressão. [...] o que houve foi um ato imediato, do ministro Alexandre, tirando do ar o que estava no sítio da Crusoé. Para mim, ressoa como uma verdadeira censura e é inconcebível".
Estava escancarado o racha institucional dentro do próprio STF.
Na manhã desta quarta, também em entrevista dada ao Estadão Notícias, o ex-Ministro e Presidente do STJ, Gilson Dipp, asseverou que o evento já maculou a imagem do Supremo, e arrematou: "num momento em que não poderia ser maculado, porque nós estamos vivendo em uma sociedade de intransigência, onde há confronto entre os poderes, onde há arbitrariedades manifestas, praticadas por todos, e precisaríamos ter a Suprema Corte como algo acima do bem e do mal". Leitura ponderada e que revela o momento grave e delicado da institucionalidade nacional.
Diante dos fatos narrados, já há movimentação intensa no Senado para protocolar o pedido de impeachment dos Ministros Alexandre de Moraes e Dias Toffli. Tragicomicamente, concordo com a afirmação do Procurador do Estado de São Paulo, André Domingues Fígaro, que publicou em sua conta no Tweeter [4]: "Do Inquérito Supremo: Solução institucional pouco traumática: pleno acaba com a brincadeira; Solução institucional traumática: impeachment; Solução não institucional com ferimentos leves a moderados: desobediência civil; Solução não institucional grave e indesejável: cabo e soldado".
Certamente é um dos episódios mais lamentáveis desde a redemocratização de 1988. Instituições bem consolidadas e respeitadas são de fundamental importância para a democracia, mas não há como desvencilhar essa omissão colegiada do Supremo da imagem da própria instituição. É triste ver esse decisionismo destruir o que aprendi em anos de estudo. É terrível ter que acompanhar a convulsão das nossas instituições. Que tempo esse que estamos vivendo.
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[1] Acesse o inteiro teor aqui: http://www.mpf.mp.br/pgr/documentos/INQ4781.pdf
[2] Acesse o inteiro teor aqui: https://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/wp-content/uploads/sites/41/2019/04/INQ-4781-1.pdf
[3] Acesse aqui: https://g1.globo.com/politica/noticia/2019/04/16/marco-aurelio-ve-censura-e-retrocesso-em-decisao-que-mandou-retirar-reportagem-de-site.ghtml
[4] Acesse aqui: https://twitter.com/FigaroAndre/status/1118351287114977280
Depois da instauração de um inquérito para a apuração de "fake news" cujo alvo das ofensas seriam os ministros do STF (conforme descrevo aqui), na tarde desta última segunda, dia 15, o Ministro Alexandre de Moraes ordenou a retirada da matéria que liga o atual Presidente do Supremo, Dias Toffoli, à Odebrecht, veiculada pela revista Crusoé e o site O Antagonista. A censura provocou a indignação de renomados juristas nacionais, fato que trouxe à memória os mais obscuros tempos da inquisição medieval.
Não obstante, na manhã desta terça, dia 16, Alexandre de Moraes autorizou ainda oito mandados de busca e apreensão e determinou bloqueios de contas em redes sociais. Seguiu-se, à tarde, o início de um confronto direto entre instituições. Em manifestação dirigida ao Ministro Alexandre de Moraes, a Procuradora-geral da República, Raquel Dogde, informou o arquivamento do Inquérito 4.817 [1], o mesmo instaurado de ofício por Dias Toffoli. Conforme observou Dodge, em posicionamento juridicamente questionável, mas politicamente memorável, "O sistema penal acusatório estabelece a intransponível separação de funções na persecução penal: um órgão acusa, outro defende e outro julga. Não admite que o órgão que julgue seja o mesmo que investigue e acuse".
Destarte, horas após, o Ministro Alexandre de Moraes indeferiu a Promoção Ministerial, argumentando, dentre outros, que "Na presente hipótese, não se configura constitucional e legalmente lícito o pedido genérico de arquivamento da Procuradoria Geral da República, sob o argumento da titularidade da ação penal pública impedir qualquer investigação que não seja requisitadaa (sic) pelo Ministério Público" [2].
Estava demonstrada a queda de braço entre o MPU e o STF.
Por sua vez, em entrevista à TV Globo, o Ministro Marco Aurélio não poupou reprovações à controvérsia, salientando que houve um retrocesso evidente: "Estou há 28 anos no Tribunal e nunca vi uma decisão dessas de retirar reportagem. Pela nossa Constituição, todos temos direito à informação, presta informação, direito à livre expressão. [...] o que houve foi um ato imediato, do ministro Alexandre, tirando do ar o que estava no sítio da Crusoé. Para mim, ressoa como uma verdadeira censura e é inconcebível".
Estava escancarado o racha institucional dentro do próprio STF.
Na manhã desta quarta, também em entrevista dada ao Estadão Notícias, o ex-Ministro e Presidente do STJ, Gilson Dipp, asseverou que o evento já maculou a imagem do Supremo, e arrematou: "num momento em que não poderia ser maculado, porque nós estamos vivendo em uma sociedade de intransigência, onde há confronto entre os poderes, onde há arbitrariedades manifestas, praticadas por todos, e precisaríamos ter a Suprema Corte como algo acima do bem e do mal". Leitura ponderada e que revela o momento grave e delicado da institucionalidade nacional.
Diante dos fatos narrados, já há movimentação intensa no Senado para protocolar o pedido de impeachment dos Ministros Alexandre de Moraes e Dias Toffli. Tragicomicamente, concordo com a afirmação do Procurador do Estado de São Paulo, André Domingues Fígaro, que publicou em sua conta no Tweeter [4]: "Do Inquérito Supremo: Solução institucional pouco traumática: pleno acaba com a brincadeira; Solução institucional traumática: impeachment; Solução não institucional com ferimentos leves a moderados: desobediência civil; Solução não institucional grave e indesejável: cabo e soldado".
Certamente é um dos episódios mais lamentáveis desde a redemocratização de 1988. Instituições bem consolidadas e respeitadas são de fundamental importância para a democracia, mas não há como desvencilhar essa omissão colegiada do Supremo da imagem da própria instituição. É triste ver esse decisionismo destruir o que aprendi em anos de estudo. É terrível ter que acompanhar a convulsão das nossas instituições. Que tempo esse que estamos vivendo.
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[1] Acesse o inteiro teor aqui: http://www.mpf.mp.br/pgr/documentos/INQ4781.pdf
[2] Acesse o inteiro teor aqui: https://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/wp-content/uploads/sites/41/2019/04/INQ-4781-1.pdf
[3] Acesse aqui: https://g1.globo.com/politica/noticia/2019/04/16/marco-aurelio-ve-censura-e-retrocesso-em-decisao-que-mandou-retirar-reportagem-de-site.ghtml
[4] Acesse aqui: https://twitter.com/FigaroAndre/status/1118351287114977280
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